sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Poder da Morte

Impressionante como é frio o poder da morte.
Não há aconchego e as noites são longas.
Evidente solidão do abraço que se ama.
O nada é tudo que persiste em volta.

Impressionante como é escuro o poder de morte.
As cores se esvaziam em sua presença trágica.
Os olhos, confusos, nem se sabem, nem se abrem.
A cor da dor é simplesmente cinza

Impressionante o silencio imposto pelo poder morte.
Música de calar a renitente sinfonia da alma.
Gritos e gemidos, que se propagam pelo avesso.
Pausas de vida que sangram toda hora.

Muito mais impressionante que o poder da morte é o da vida!
Torna e retorna toda vida simplesmente dela.
Uma vida vale sete, sete vidas umas tantas belas!
Todas as luzes, músicas, cores são certas.

Não há um instante da vida que não seja belo.
Repleto de si e de tudo como um infinito transborde.
Sons dos tons que se harmonizam tantos acordes.
Que a vida de tanta vida, se exagera.

Se tiver que viver tanto e um dia encontrar a morte.
Que seja acompanhado de toda a vida que carrego.
Dançar a valsa sombria do último pressentimento.
Até que ela desista de escurecer o dia eterno!

domingo, 7 de novembro de 2010

Estava lá.

Ele estava lá.
Num canto, calado, estaria lá?
Perdido, pedindo, estorvo. Mas, lá?
Na esquina da minha rua.

Estendeu a mão.
Vazia, vadia, erguida a mão.
Doentio, doendo, sacou a mão.
Na cara, na veia, mão nua.

Estaria em mim.
Sua dor, agonia, sentida em mim.
Solidão, seu frio invisível de mim.
Agora já não era mais sua.

Ele deu no pé.
Ergueu-se em seu claudicante pé
Lava minh’alma, me leva, mais leve fé
Some minguante na luz da lua.

domingo, 17 de outubro de 2010

Únicas e Tantas

Já amei mulheres tão únicas e de maneiras tão diferentes
Que não sei se elas mudaram tanto ou se eu tanto mudei o que se sente.

Houve uma época em que amar era fulminante
Olhar que se perde num olhar infinito
Onde o tempo de fora parava e o de dentro era sentido
Tinha que ser muito, tinha que ser sofrido
Tinha que ter o medo, emoção, taquicardia
Mão suada, expectativa. Flores roubadas, verso e melodia.

Amei muitas assim. Tantas que nem mesmo elas o sabiam.
Em silêncio, às vezes, em desespero
Até que um dia nada mais existia.
Aquela poesia se ia como chegara
Tão repente quanto o nada ficava
Como se o fim não fosse apenas agonia.

Já amei tantas mulheres diferentes e de tão únicas maneiras
Que não sei se me amaram tanto ou se tantas vezes amei a mesma.

Amei de forma racional e responsável.
Atendendo à tudo aquilo que de mim esperavam.
De mãos dadas, sem arroubos, equilibrado.
Compromissos de vidas eternamente unidas
Pela união das vidas mais socialmente ensimesmadas.

Reuniões de família, aniversário da tia e enxoval,
Casamentos e fotos, vestidos. Onde passaremos o Natal?
Sobrenomes e sobremesas tradicionais no almoço dominical
Anéis, compromissos, sorrisos, tal e coisa, coisa e tal...

Enfim, amei tanto uma única mulher que de tão diferente sozinha ela era todas
Que não sei porque tão loucamente amava ou se a amava simplesmente de tão louca.

Ela me jogou silenciosamente numa rotina
De amar tacitamente seu amor todos os dias
De tantas maneiras que a única coisa que se repetia
Era a necessidade incontida de sempre amar.

Ela me fez me acostumar com a sua presença
Que mesmo um encontro inesperado era a imensa
Alegria incontida dispersada na descrença
Da sensação de estar junto mesmo antes de encontrar.

Um dia simplesmente imaginei viver sem ela
Fui revisando hipoteticamente os momentos não vividos
Senti uma angústia de morte, frio, medo e vazio,
Até que tudo o que se sentia não fazia mais sentido.

Naquela hora voltei chorando para casa
Lacrimejando os medos que em mim se escondiam
Velei seu sono durante a longa madrugada
Dormi seguro quando seus olhos se abriram.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Assim ao Fim

Ser amigo é o que se precisa!
Tem que apertar as mãos quando se conhecer
Tem que conhecer o abraço quando precisar
Tem que precisar de um ombro se for chorar
Tem que chorar
Antes que tudo chegue ao fim

Ser amigo é o que se precisa!
Tem que acordar disposto antes do amanhecer
Tem que amanhecer acordado se precisar falar
Tem que falar o que pensa e falar sem pensar
Tem que pensar
Antes que tudo chegue ao fim

Ser amigo é o que se precisa!
Tem que botar no peito enquanto o coração bater
Tem que bater no ombro quando tudo se acabar
Tem que acabar com tudo quando o fim chegar
Tem que chegar
Antes que tudo chegue ao fim

domingo, 12 de setembro de 2010

Se...

Se os meus olhos nunca vissem a luz do seu sorriso
Se os meus ouvidos não escutassem o som do seu riso
Se minha pele não sentisse o arrepio desse toque liso
Isso não seria um amor...

Se a canção não calasse minha voz profundamente
Se o silencio não insistisse em ser a música da mente
Se no peito o coração batesse seco e simplesmente
Esse não seria um grande amor...

Se aquelas lembranças nunca tivessem sido vividas
Se as palavras não tivessem sido tão intensamente ditas
Se o meu pulsar não obedecesse ao ritmo dessas batidas
Aquele não seria o meu amor...

Se isso não fosse um amor,
Se esse não fosse um grande amor
Se aquele não fosse o meu amor,
Eu não seria você.
Você não seria quem eu sou.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Presença do Ausente

De todas as coisas que eu não fiz,
Mais me arrependo do beijo ausente!
Faltou-me na boca a ternura do toque sereno,
O leve massagear de lábios convergentes.
Um discreto sugar na lisa superfície almejada,
A saciedade do suspiro injetado na gente.

Se faltou-me, na boca, o beijo,
Muito mais os abraços nos braços desertos.
Desguarnecer o próprio peito que se faz aberto,
Conectar-se em laço no enlace fraterno.
Descobrir se encaixam as matérias repelentes,
Compactar-se como prensa fugaz do eterno.

De todas as palavras não ditas
Lamento o silêncio no lugar do “eu te amo”.
Alma que não sussurra sentimentos contidos,
Contidos em sentimentos que juntos desperdiçamos.
Por que o silêncio na amplitude do vazio que separa?
Se juntos inexistem pausas para os sons que pensamos.

sábado, 19 de junho de 2010

Entre Nós Dois

Sei que as vezes parece mais fácil
Desistir de vencer essa vida
Abrir suas asas, partir e voar
Mas a realidade lhe espera
Com a leveza sutil de uma pedra
Jogada do décimo quinto andar

Parece bem fácil
Pra quem está lá em baixo
Não sabem a dor que eu tenho pra dar
Parece pequena
Mas com a convivência
Cada gota transborda um mar

Um dia
A morte aterrisou
No lado de cima da marquise
Que, em baixo, minha vida passava.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Quando quem será?

Quem conhece o tempo de todas as coisas?
Quem pode dizer até quando vai durar?
Quanto tempo se passa enquanto a noite não chega?
Quando chega a noite eterna, quem poderia ficar?

Quantas batidas o peito insiste e reclama?
Quando saber que aquele é o último ar?
Quem se arrisca a deitar sozinho na cama?
Quem deitaria para não mais se levantar?

Quantas gotas brancas veremos na espera?
Quantas vermelhas ainda irão gotejar?
Quando as preces aflitas serão de alívio?
Quem na distância arrisca um olhar?

Quando chega? Quando? Chega!
Quem queria, quem verá?
Quanto tempo? Resta tempo?
Quem seria? Quem será?

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Beleza Pura

Ninguém poderia supor a delicadeza que ali mora
Não que haja disfarce ostensivo pelo lado de fora
Mas, quem acreditaria na pureza da bela?

Olhos que disfarçam o amanhecer da existência
Boca que delata o infinito pulsar da paciência
Afinal, quem embelezaria aquela pura aquarela?

Pensamento que rodeia a simplicidade do possível
Transcendendo a inimaginável poesia indizível
Quem se apropriaria da beleza puramente dela?

Carne que a verdade provou a dor que a alma sente
Escarnece a luz da sombra que ilumina toda gente
Apura a beleza, ela sabe. Sempre bela! Seja ela!

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Não precisa

Não precisa ser para sempre,
Desde que haja sempre um “para sempre”,
Mesmo que o sempre pare. Repare:
O sempre é sempre de repente
Não porque de repente o sempre se foi
Mas, pelo tanto que o de repente se eternizou...

Não precisa ser sempre lógico.
Duas metades na precisão da balança
Aprecia, o amor, essa estática dança?
Nunca mais, nem nunca menos?
A menos que falte tanto quanto sobra
Matéria que se equivale e coincide pelo avesso.

Não precisa sequer ser inofensivo
Deixe que o amor exponha a dor de ter sentidos
Pelo preço da pele, pelo pêlo, dor que retine
Tímpanos, sinta-nos, toca-nos, tilinte
A sêca que seca, embaça em brasa a retina
Boca que beija, se deixa, insiste, desiste, mastiga.

Não precisa ser preciso. Precisa?
Nada é tão preciso. Se fosse, precisaria tanta poesia?
Fita de medir o tamanho do infinito
Sentimento que existe pelo tanto que sentimos
Deixemo-nos ser como se nada mais existisse
Até que tudo venha a ser em nós preciso.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Quase um Adeus!

Ouça o que eu tenho para lhe dizer
Mesmo que já tenha sido dito
O momento é necessário apesar de maldito
Todo mundo precisa ouvir “adeus” para entender que acabou.

O tempo passa como gotas que caem do meu rosto
Uma após a outra, lágrimas de marcar estações
Cobrando seu pedágio por todas as sensações
Boas ou más, sempre intensas, mesmo que não sentidas

Tempo. Lugar de guardar as coisas que na vida acontecem,
Organizador da coexistência de todos os momentos
Que em cada um de seus muitos compartimentos
Guarda tudo, na síntese errante de um único ser

Somos o resultado tangível do invisível que vivemos
Existências irreais dos sentimentos carnalizados
Emoções construídas em peitos dilacerados
Sintomas de som, calor, suor, pele, beijo

Você aprendeu a viver com a dor de existir
E me ensinou a conviver com o absurdo da solidão
Amor sentido nos sentidos, sempre não
Retidos todos, ressentido coração.

Agora, eu, peso o peso do caminho percorrido,
E você, leve o leve do caminho que nos resta
Enquanto escrevo, a paciência insiste, a dor me testa
Deixo que tudo seja como simplesmente tem que ser.

Luz!

Ao contrário do que pensamos não somos capazes de ver as coisas como elas são.
Nos limitamos a simplesmente perceber a luz que essas coisas refletem.
Se a luz é muito intensa, tudo, inclusive o preto, se torna branco.
Se sem nenhuma intensidade, tudo, inclusive o branco, se torna preto.

Quando vemos dois objetos de mesmo tamanho recebendo mais ou menos luz
Percebemos tamanhos diferentes entre eles.
Se mais luz, maiores, se menos, menores.

Olhar para um objeto pouco iluminado é não ver seus detalhes.
Olhar para um muito iluminado é como tatuar a sua forma na retina
A ponto de mesmo quando não se está mais olhando para ele
A imagem permanecer na sua frente, sobreposta a tudo
A despeito da ausência do objeto que se viu

Somos seres extraordinariamente fascinados pela luz.
Há aqueles como insetos que sacrificam a própria vida para alcançá-la.
Outros como morcegos gabam-se de não precisar dela
E vivem a vida semelhantemente regida por sua ausência,
Necessitando de sua existência, pelo avesso.

Nós, seres sem qualquer luz própria
Achamos graça da maior de todas as luminárias
E tudo que fazemos, fazemos daquele jeito ou naquela hora
Dependendo da posição que ela esteja.
Insistimos em lhe atribuir responsabilidade pelos momentos
Mais sublimes de nossas existências, quando ela aparece ou some atrás do horizonte
Num repetitivo e sempre novo ritual de cada dia
Que ela mesma nem sabe que nos proporcionou.

Iluminamos para nos sentir seguros.
Se vemos a luz refletida nos objetos podemos analisar o tamanho do perigo
E decidir se corremos para o ataque ou fugimos do inimigo.

Quando precisamos de mais energia apagamos os luzeiros menores
Para que tudo se torne solidão a nossa volta.
Acalmamos os sentidos mais ocultos de nossos corpos
Para percebermos que dentro de nós ficaram inúmeras impressões
Produzidas por incontáveis objetos iluminados ao longo de todo dia
Que precisam ser devidamente digeridas através de processos mentais
Que convencionamos chamar sonhos.

Somos viciados em luz!
Mesmo cegos, queremos senti-la por perto.
Saber que ela está lá.
Se não para vermos, quem sabe, pelo menos para sermos vistos?
Talvez por outros viciados.
Talvez pela Luz que nos viciou.


“Marcello Guimarães, de 34 anos, que perdeu a visão no início da adolescência. É instintivo: à noite, quando entra em casa, o primeiro movimento que faz é o de tatear a parede em busca do interruptor. “É puramente emocional. Eu percebo a presença física da luz, ela preenche o espaço e eu não me sinto sozinho quando a luz está acesa. A escuridão me dá a sensação de vazio. Se não acendo as luzes, é como se o meu lar estivesse abandonado. Não enxergo nem mais, nem menos com a luz. Mas a presença dela é reconfortante”. – Jornal O Globo